sábado, setembro 01, 2012

O novo plano

"O que a gente faz agora, professor?", disse ele, com uma expressão realmente preocupada. "Estão pressionando muito e não sei se consigo aguentar isso, sinceramente. Não sei o que fazer!", concluiu. O outro estava parado, encostado na parede, com os braços semi-cruzados, uma das mãos segurando o queixo. Observava as águas do Guaíba e no fundo desejava aquela mesma paz. "Professor?!", o outro disse quase gritando, o que interrompeu aquele fluxo sereno em que estava, quase um transe. Mal humorado, olhou de volta para aquele homem assustado e sentiu pena. Queria não ter que pensar nisso, mas não tinha jeito. "Já sabemos o que tem que ser feito. Já fizemos uma vez", disse. "Tem certeza professor? Você vai ficar bem?", o outro indagou.

Nesse momento, voltando-se novamente para as águas do Guaíba, ele disse num misto de fala com suspiro, "Sim", enquanto pensava consigo mesmo "É, acho que até posso usar isso ao meu favor. Um novo descanso pode ser bom". "De todo modo", retomou, "temos que cuidar para que isso se torne um trunfo mais adiante. Se esses torcedores querem a mudança, é isso que vão ter. Mas quero vê-los se arrepender disso, ah se quero!". O outro, ainda claramente assustado, esboçou um sorriso discreto, como se custasse todas as suas forças produzi-lo. "Bem, professor, diga o que quer eu faça", pediu.

"'É o seguinte. Você vai escalar o time que a torcida quer. Comece devagar, claro. Primeiro", e nesse momento ele deu um longo suspiro, "bem, primeiro comece por mim. Depois, tire o Nei também. O Kleber já vai ser fácil, por conta da lesão. Por fim, o Índio, quando o Juan voltar". Fernandão olhou muito triste para seu amigo, dizendo "Sinto muito, professor. Somos amigos e te admiro demais. Você sabe muito, joga muito e está fazendo um trabalho muito bom desde a saída do Dorival. Pena que estamos tendo azar. Merda!", desabafou por fim.

"É o seguinte", disse Bolívar se aproximando e falando mais baixo, "é pra fritar o Moledo, ouviu. Principalmente ele, mas o demais também. O Inter tem dono, pô! Enquanto esse caras novos estiverem com alguma moral, a torcida vai ficar enchendo nosso saco. Então, nós vamos deixar eles entrarem, mas vamos esculhambar o meio de campo, para que eles fiquem sem proteção. Com isso vão certamente começar a errar muito. Não há zaga que resista a um meio-de-campo mal armado. É preciso fazer a torcida nos querer de volta, entende? Aí, quando estiverem desesperados, voltamos pro time e passamos a jogar direito e a vencer os jogos, até acalmar os ânimos e a gente poder relaxar novamente. E assim vamos cozinhando, sempre em banho-maria. Já deu certo uma vez, por que não daria novamente?", piscou e deu tapinha nas costas de Fernandão, tentando encorajá-lo.

"Não queria que fosse assim, meu amigo, você sabe disso, né?", disse Fernandão. Bolívar olhava com pena para Fernandão. Também gostava dele e não imaginava que fosse fácil fazer o papel que ele agora fazia, um mero testa-de-ferro da direção, fingindo que dirigia o time, apenas para que a ira da torcida fosse aplacada ou melhor absorvida. Essa era a ideia desde o início e ele foi corajoso em topar. "Ele é gente boa", pensou consigo mesmo, "é... sim, é gente boa. Acho que estou é me cansando dessa coisa toda...". Bolívar voltou a olhar para o Guaíba, enquanto Fernandão saiu calado, já focado no novo plano, mas com um novo temor começando a se insinuar. "E se o tiro sair pela culatra?", pensou, para logo em seguida afastar o pensamento e apressar o passo.