O treinador arma um retrancão, jogando os 90 minutos por um lance fortuito, acha um gol de escanteio ou bola parada e vence; logo vaticina-se: gênio, nó tático, brilhante, regulamento-debaixo-do-braço etc.
Em contrapartida arma uma equipe pra frente, equilibrada, faz um grande enfrentamento, de igual-pra-igual e acaba por perder o jogo num detalhe, num detalhe; os rótulos são diferentes: ultrapassado, equipe faceira e sem intensidade, arroubos de grandeza, megalomania, etc.
O mundo do futebol é maniqueista e os fins justificam os meios: a vitória, fruto ela de um acerto ou não é sempre saudada; à derrota surgem as críticas e os descalabros. Não há meio termo.
Pois bem, anunciada a escalação de Abel ante ao Cruzeiro, fiz as seguintes ponderações:
- O ingresso de Valdívia é interessante porque mantém a verticalidade adquirida com Sasha, haja visto serem os unicos jogadores mais objetivos da equipe. Dessa forma a equipe retém a possibilidade de contra-atacar em velocidade, além de obrigar o lateral-esquerdo adversário a cuidar os avanços nas suas costas
- Abel coloca os 2 volantes de forma a cada um barrar os avanços cruzeirenses pelas pontas; Aranguiz, centralizado, vigia Everton Ribeiro e sem a bola será responsável pela infiltração e chegada ao gol adversário.
- A saída de Alex implica que a maior preocupação é defensiva; a equipe troca a cadência e posse de bola por um resguardo maior, almejando não tomar gol para depois especular ou arranjar um gol numa jogada individual
Entretanto, foram necessários apenas 12 minutos (muito antes de o Cruzeiro marcar seu gol) para perceber-me do grande erro de estratégia cometido. E este erro não passou por nomes, por A ou B; foi muito além.
O problema do Inter, ao meu ver, foi a postura. As duas linhas (uma de 4 e outra de 5) que deveriam estar compactadas apresentaram um enorme buraco, por onde flutuaram os atletas cruzeirenses sem marcação; a marcação que deveria ser extremamente agressiva quando próxima ao meio-de-campo só assim era quando próxima da nossa intermediária; basicamente o Inter optava por defender-se apenas no último terço do campo.
Com a liberdade oferecida e o Cruzeiro rondando nossa meta com tamanho ímpeto e regularidade, a conclusão possível era que o gol era questão de tempo. E assim foi. Aliás, o 1º tempo acabou saindo barato tamanho o baixo nível apresentado.
Contextualizemos agora, de cabeça fria (?!), que a equipe colorada passou a semana inteira se preparando, sem viagens, sem necessidade de priorizar esta ou outra competição (afinal era a única que sobrou), e tinha uma oportunidade única de não apenas reabrir a competição, mas afirmar-se de maneira categórica e inquestionável como real postulante ao título.
O que se esperava, independente de nomes, era sangue nos olhos, faca entre os dentes ou qualquer outro jargão esportivo do naipe. Esperava-se uma equipe ligada, jogadores mordendo, vibrando, disputando cada bola como se fosse última. Veio à memória a preleção de Fernandão no vestiário de Yokohama, minutos antes de enfrentar o temido Barcelona, algo nas linhas de "...aquela era a Copa do Mundo daqueles jogadores, a derradeira chance de fazer história".
O que se viu foi uma atuação apática, insossa, sem pegada, sem vibração, sem garra, sem alma. O Inter do 1º tempo perdeu ao natural, aceitando a derrota com uma resignação e passividade que de certa forma me provoca uma raiva tão grande quanto se tivesse sofrido uma derrota humilhante.
Algum desavisado poderia imaginar que era o Cruzeiro que precisava urgentemente da vitória, e não o inverso. Não existe pior derrota do que perder sem lutar, e esse foi o sentimento que ficou impregnado após os 45 minutos iniciais.
Talvez devido a um misto de vergonha e/ou bronca no vestiário, a equipe voltou para o 2º tempo não apenas com um mínimo de hombriedade mas com uma postura totalmente diferente, o suficiente para deixar a impressão que tudo poderia ser diferente.
O pior, meus amigos, é que o jogo foi simbólico no que se refere ao abismo atual (repito, a-t-u-a-l, nada a ver com a grandeza dos clubes) entre um clube e o outro.
Este abismo é reflexo de nada mais do que a mentalidade (e letargia, resignação, passividade) vigente de direção, comissão técnica e jogadores de um clube e de outro; a diferença de postura e de ambição é muito grande, e isto é transposto para o campo.
Antes que alguém argumente que o plantel cruzeirense é muito melhor que o colorado, e que tudo trata-se apenas de uma diferença de qualidade, eu divirjo; a diferença é muito menor do que aquela que ficou explícita no jogo.
Basta olhar no embate que o próprio coirmão (e outras equipes menores, por exemplo o Sport) fez contra a equipe azul celeste; cientes de suas limitações, mas com agressividade e jogos muito menos covardes que o colorado.
Por fim, mais do que nunca fica claro que a batalha colorada é pela Libertadores.
Triste é constatar que o jejum que já dura 4 anos ocorre em momento histórico; onde os investimentos atingem patamares inéditos mas simplesmente não resultam em títulos.
Dado as circunstâncias de gestão, até mesmo a vaga pra competição continental já deve ser comemorada. Se vier, vai ser preciso repensar o futebol e o próprio Inter como um todo, e todo sopro de renovação parece ser bem vindo.
De certa forma, os próximos 3 jogos meio que encaminham se tal objetivo será alcançado. Chapecoense fora, e 2 confrontos diretos em casa (Fluminense e Corinthians).
Seis ou mais pontos praticamente selam o alcance do prêmio de consolação; já novos revezes podem complicar a situação, com consequências irreparáveis.
Cabe agora lamber as feridas (abraços Tite, saudades!) e deixar pra trás uma atuação (e postura) que de certa forma não apenas desiludiu completamente os colorados, mas deixou também um que de indignação e inconformidade nos torcedores.
Certeza é, que se não houver mudança de postura, muitas dificuldades se avizinham pelas bandas do Gigante.
@Davi_Inter_BV