quarta-feira, setembro 03, 2008

48 Não tá morto. Mas quem peleia?

48

Leio El País e BV, se não diariamente, sempre que posso. Nos últimos dias estou mais tranquila, um pouco dessa frenética energia de conhecer a Europa se acomodou e vivo dias de legítima habitante. Hoje, por acaso, li cedo o jornal e pouco mais tarde o professor Raul. Deparei-me com situações - ainda que não diretamente - interligadas.

(Enquanto pra vocês o relógio bate sete e meia da noite, aqui são meia noite e meia, portanto, pra mim já quinta-feira, meu dia, oba!).

O jornal tava muito bom de ler, cheio de coisas interessantes, entre elas uma notícia sobre La Fundación Nuevo Periodismo Iberoamericano, que tem em Gabriel García Márquez, escritor colombiano, seu representante máximo. Em Monterrey - México, aconteceu ante-ontem a entrega de prêmios da fundação e entre os premiados estava Iñaki Gabilondo, jornalista espanhol que trabalhou anos em rádio, jornal e hoje apresenta um informativo diário, às 21:00, no canal Cuatro, emissora de tv do El País. Eu gosto dessa emissora não apenas pelo jornal, que me agrada muito ler, mas também pela programação, com seriados irreverentes e outros bons programas.

Esse jornalista é daqueles de intelectualidade respeitada, abre o jornal televisivo com editorial, ou seja, apresenta as notícias, mas antes emite sua opinião sobre assuntos diversos. Foi o primeiro prêmio da fundação destinado a um espanhol. Mas o legal dessa reportagem é o que falam García Márquez e Gabilondo sobre jornalismo. O primeiro, além dos clássicos consagrados que lhe renderam um Nobel de Literatura, sustenta uma história de jornal impresso marcante. Pra se entender melhor o escritor colombiano, posso puxar nosso familiaríssimo Fernando, o Veríssimo. É como ele, de livros consagrados e coluna em jornal, só que mais “puta-velha”, sem risco de ofender meu conpatriota, pois garanto que Veríssimo assim o reconheceria. Na verdade, defino em pé de igualdade o colombiano com o pai de Fernando, Érico. Compararia a grandeza épica de O Tempo e o Vento com Cem Anos de Solidão.

Retomando o foco, esse mestre das letras e de alvas melenas disse que “Cada mañana es un desastre, y sufro como un perro. Encuentro muy pocos reportajes que pueden considerarse joyas y cuando lo hago pienso: ¿Quién será este tipo?”. Confesso que por um momento de delírio, daqueles que todo mundo tem, mas não conta pra ninguém, me inflaria mais que balão de festa de criança, imaginando o ancião interando-se a respeito do futebol latino, lendo meu texto e perguntando-se

“¿Quién será esta tipA?”

- E... E... Eu sou de Santa Cruz do Sul!

Retomando outra vez (agora, depois dos meus devaneios), nos identificamos com esse desespero frente à imprensa, que pode ser esportiva, cultural, política, ou o que for. Trata-se da Máquina. É tudo friamente calculado e no futebol, por exemplo, a quantidade das negociações especuladas ultrapassa as de fato sucedidas. E quem acompanha (torcedor) sofre mesmo como um cachorro.

Com sabedoria Gabilondo seguiu o discurso lúcido de que “La información ha sido derrotada por las empresas de comunicación... Ahora los periodistas están como hipnotizados por la serpiente de la política, los grandes financeiros, espectáculos o deportistas, donde las vicisitudes humanas cada vez se ausentam más”. O que nessas palavras não se encaixa no futebol moderno? Não preciso traduzir né? Somos todos filhos do latin e vítimas/clientes/usuários desse comércio verbal, visual e escrito.

Admiro e reconheço a relevância dessas colocações, mas dá um desânimo. Daí eu leio o Raul Pons, falando sobre a trajetória dos jogadores argentinos no Inter. Vejo um perfeito exercício da informação e noto que até nossos rivais deleitariam-se com o assunto, pois hermanos há muito protagonizam, hora ou outra, nossos campos gaudérios.

Aprofundo-me um pouco mais e reclamo de nós mesmos frente ao espelho. Esse clima de derrota generalizado me assusta. É aceitar o domingo de video cassetadas. É tomar Brahma porque apareceu na novela das oito, ou Antartica pela Juliana Paes (ainda que me contestem os rapazes, a boazuda não sai de dentro da garrafa. E pela ceva, sou mais da Skol, ou Polar pra gauchada). Tem um pouco dessa apatia que não contesta a informação que nos vendem porque sabe que nada vai mudar. E mais outro tanto desse conformismo pelas análises de pontuações e porcentagens de aproveitamento. Ora bolas, fodam-se as estatísticas é meu time (perdão, mas vai assim, mais coloquial) porra!

Tem gente que não desiste: na prensa matinal, no noticiário, nos seminários, fóruns, congressos, concretos e gramados. Esse pessoal me desperta pra vida, Guiñazu! Digo mais, um cara que já passeou pelo pior e melhor e segue suando sangue é o Índio, véio de guerra. Tá nem aí, treina, joga e dane-se o resto.

Se García Márquez houvera sucumbido frente ao jornalismo programático, talvez não tivesse publicado um delicioso Memórias de Minhas Putas Tristes. Se Iñaki Gabilondo não fosse tão firme na saga da informação esclarecida, quem sabe teria abdicado desse momento precioso junto a um mentor da literatura. Se o Raul abandonasse o Inter nos anos noventa, hoje poderíamos não estar lendo seus preciosos registros. Pra se fazer ou contar a história, há de vivê-la intensamente, caindo em pé. E não proteger-se numa hipócrita postura, dita realista. A realidade é o próximo jogo, depois vem a tabela. Nem Márquez em meio à desesperança da clausura de Ingrid Betancourt, nem Gabilondo nos duros tempos de Franco, nem Raul nos anos de ostracismo alvi-rubro desistiu. Sejamos um pouco mais valentes, pois desse jeito (e sem ter o que perder) não arriscamos uma atuação memorável no próximo grenal, nem jogo inesquecível pela Sul Americana, tampouco um longínquo aroma de G4. O fluxo da sinergia se direciona da arquibancada ao campo, não me digam que é teoria de zodíaco, vocês sabem que é verdade. Se nenhum colorado esboçar reação, quem vai?