quarta-feira, agosto 08, 2007

35 A Dona Dalva

35
Escrito por Diana Oliveira

Bom dia sol. Adoro, simplesmente adoro um dia de sol. Acordo de outro jeito, trabalho com outro humor, vejo a vida sob outra ótica, tudo pela presença dele, iluminado e iluminando. Abro a veneziana e deixo o vidro fechado da janela do meu quarto, a partir do meio dia ele bate em cheio na minha cama e esquenta até meu travesseiro. Quando chego em casa à noite tá tudo quentinho, aconchegante. Um dia de sol me faz acreditar na vida, nas pessoas, nas causas e também me lembra ela. Pudera, Dalva é nome de estrela, Sol é o astro rei.

A Dona Dalva é muito simpática, sorriso radiante. É loira, pele e olhos claros. Tem quatro filhos, a todos trata com muito carinho, por todos fez os mais variados sacrifícios e de todos possui grande respeito e admiração. Ela não pôde concluir os estudos, como proporcionou aos seus e para isso, mergulhou na máquina de costura dias e noites. Nos primeiros tempos, os mais difíceis, pausava o trabalho de coser para cozer, sempre rapidamente, de bicicleta, de casa ao trabalho, e vice-versa. O prato, feijão pronto da noite anterior, arroz, bifes passados na hora e uma saladinha, bastante cenoura e alface, os preferidos da casa.

Os anos passaram, da única máquina surgiram outras, do fardo solitário passou ao comando dos funcionários, de costureira à pequena empresária, de segundo grau incompleto à curso de moda, eis a Dona Dalva. De todo o tempo que conheço a Dona Dalva, esteja na situação em que estiver, nunca vi lhe faltar o sorriso honesto no momento de um bom dia, seja esta a saudação para um parente, amigo ou qualquer desconhecido da farmácia, açougue ou padaria. Muito já vi a desacreditarem, mas nunca a vi desistir. Jamais pude entender de onde ela tira tanta força ou se aquela disposição é feita de pura inocência. O fato é que não há nada nesse mundo que a Dona Dalva tenha tanto almejado que não tenha conseguido. Sempre linda, sempre sorridente e invariavelmente confiante, primeiro nela, depois no destino.

A Dona Dalva ampliou os negócios adquirindo uma loja num shopping da capital, adjunta de um sócio, encarregado da parte burocrática, tocaram a loja tranqüilamente até contratempos forçarem uma separação. O sócio se foi, levando a parte que lhe cabia e a Dona Dalva, no tradicional sorriso confiante, seguiu tocando os negócios. Há pouco tempo o shopping incendiou, prejudicando muitas lojas, desde perdas diretas até impossibilidade de vendas, pois o local foi interditado. Ao receber a notícia do incêndio, nossa heroína calmamente ponderou que o trágico já havia ocorrido e mantendo a serenidade foi juntar-se aos demais lojistas prejudicados. Enquanto uns esbravejam, condenam culpados, anseiam pela cabeça de alguém, a Dona Dalva alegra-se em saber que os bichinhos da pet shop foram todos salvos por um funcionário do prédio, falecendo asfixiado apenas um passarinho... Ohhh...

Enquanto muitas pessoas oram e se perguntam “por que comigo Deus?”
A Dona Dalva nem gosta de ir à Igreja, dá sono.

Dias depois do incêndio ela recebe um telefonema e descobre que o sócio, aquele que se foi, era tão formalmente correto e precavido que fez um seguro da loja, desde o primeiro dia de locação. A parcela era paga no montante dos compromissos mensais e o seguro cobre até perda total, para qualquer tipo de dano.

A Dona Dalva não se envolve com futebol, mas adora ver um gol, grita e comemora com aquele famoso sorriso. Na última vez em que assisti a um jogo com ela, atordoada e nervosa gritei:
- Vai sair o Fernadão!!!! Não, vai entrar o Gabiru!!!! Não vou mais olhar!!!! Não!!!!!
E ela:
- Calma, de repente esse moço entra e faz o gol

...


Eu queria deixar a todos um pouquinho de Dona Dalva, tão esperançosa. Ela acredita que independente do rumo, o estado de espírito deve ser elevado. Se alguém for incapaz de escrever alguma mensagem positiva sobre o Colorado, por menor que seja, ou alguma observação divertida, uma piada, ou até mudar de assunto pra não cair no mesmo resmungo, por favor, não escreva nos comentários hoje. A Dona Dalva não gosta de desânimo, independente do caos e esse texto é sobre ela.

A Dona Dalva é minha mãe.