Até o momento, as meninas do futebol bateram as uruguaias por 4x0, as jamaicanas por 5x0, equatorianas 10x0 – maior goleada da competição, canadenses 7x0 e mexicanas, 2x0. Estão na final, que ocorre amanhã, contra as americanas, ao meio dia, horário de Brasília. Anunciando dessa forma soa como prestígio de dream team, quatro goleadas numa competição e a honra de ter no grupo Marta, eleita melhor jogadora do mundo em 2006, até parece a seleção, não é? Mas é a seleção... só que feminina. Maravilha é perceber que o Pan apresentou aos torcedores a equipe de tal maneira que alguns erguem cartazes comparando a representatividade da Marta ao Pelé! Até hoje, nem mesmo um título que se equivale ao de Ronaldo Nazário e Ronaldinho Gaúcho consegue dar a jogadora o devido valor de seu talento e tão pouco efetivar no Brasil um Campeonato Nacional Feminino de Futebol.
Antes que alguém me diga: o futebol feminino é muito inferior ao masculino, pense que em termos de evolução estão as mulheres correndo atrás não apenas da herança cultural, mas de patrocínio, competições, apoio de confederações e mais, clubes que incentivem a prática do esporte, através de escolinhas e infra-estrutura acolhedora para milhões de meninas que poderiam fazer uso da inclusão social promovida pelo esporte. Mas, por incrível que pareça, a pátria de chuteiras nega às suas filhas a chance de evoluir com o que por estas terras é tão abundante... Abunda para os homens, para as mulheres, a bunda, isso sim é paixão nacional... No Brasil, 54% das adolescentes que não tem escolaridade alguma já ficaram grávidas, são dados do Ministério da Saúde. É desolador, sabendo que o esporte incentiva disciplina, aproxima crianças da escola e do convívio familiar, sem contar a sensação intransferível de vitória e, por conseqüência, desejo de conquistas. Não responsabilizo o futebol, exclusivamente, pelo desenvolvimento de civilidade ou dignidade, mas afirmo que é a via mais popular.
Diante do quadro totalmente desfavorável, surgem ainda guerreiras como Marta, Kátia Cilene, Formiga, Cristiane - que vem fazendo grandes jogos; Rosana, lateral esquerda, cruza e cobra faltas melhor que qualquer um no Beira Rio atualmente; entre outras. No Rio Grande do Sul o trabalho da Duda, ex-jogadora do Internacional, tem formado atletas e cidadãs, às custas de muito empenho e pouca esperança de reconhecimento público. Lembro que na última partida do SPFC, pelo Brasileirão 2006, com o título na mão, dia de festa, promoveram um jogo preliminar de modelos. Entenda-se: mulheres no campo só pra serem admiradas por seus corpos, feições e a gracinha de temer a bola, tocando de forma desajeitada, com pernas finas e compridas, estaturas longilíneas, cabelos brilhosos e camisa do uniforme presa ao corpo através de um nó, dando o “toque feminino” ao futebol, que é tão masculino...
Ou seja, dupla humilhação para as que dariam a vida por um jogo preliminar do time Campeão Brasileiro, casa cheia e oportunidade de mostrarem um futebol com menos força, velocidade e não menos graça. São estas, as meninas que não vivem para moldarem seus corpos à passarela. Suportam sim, choques, dores, músculos fadigados, em busca do que não querem menos que os homens, gol. Nada tenho contra as modelos, são lindas, maravilhosas, mas seus lugares estão lá, estabelecidos, nos palcos da moda, para os campos existem, há muito tempo, mulheres dispostas e capazes de brilhar pela vocação que às legitima a pisarem no gramado. Que sonho ser este jogo ao que me referi uma final de Campeonato Brasileiro Feminino de Futebol, abrindo o dia pro Campeão nacional, seria uma iniciativa... A desilusão se dá uma vez pelo desprezo a mulheres que jogam futebol e depois, pelo fato de estarem a sua frente musas que protagonizam uma partida de mentira, apenas porque são bonitas.
Bonita... eu? Beleza é um conceito subjetivo, não dá indícios de inteligência, competência ou caráter. De Chiquinha Gonzaga à Elis Regina, as brasileiras e não apenas estas, buscam espaço na sociedade pelo que são e não o que representam. Foram vários os elogios que eu agradeço, quando apareci na telinha do BV. Todas nós, sem exceção, gostamos muito de ouvir que estamos (ou somos) belas. Contudo, pra que vocês entendam a geração de mulheres a qual pertenço, vou me deter a dois comentários em específico. E logo da dupla...
“Com o QUASE MILHÃO de acessos do BV, estou lançando a campanha: Diana na PLAYBOY já!Do BV para o Mundo!”
Primeiro, por que seria a Playboy um meio de me apresentar ao mundo? O pudor é a forma mais inteligente de sedução e apelo sexual não é janela de sucesso, ao menos para os meus objetivos. Segundo, vou sim pra revista, mas levo junto a tua esposa, ofereço a ela 50% do cachê, com direito a closes provocativos e indicação – caminho da felicidade do Nelson.
Desculpe-me a digníssima se acabo te expondo, mas ele não se dá limites...
“com todo o respeito, mas eu imaginava ela meio feia, até o dia que ela falou que era arquiteta...aí na hora já me liguei..arquitetas geralmente são bonitas e bem cuidadas. Faz parte da profissão né...é tipo um cartão de visitas...”
O bom é que ele iniciou dizendo, com todo respeito... Porque eu seria feia? Porque tenho opinião? Brilhante conclusão de que meu tipo físico definiria minha profissão. Meu cartão de visitas são os projetos que eu crio e executo. Não existe melhor divulgação no meio arquitetônico que indicação de um cliente a outro e não há carinha bonita que supere o investimento perdido numa construção.
Se um é o Nelson, quem será o outro? O maníaco do caps lock: Cjr.
A todos os demais, senti-me lisonjeada pelas declarações e não sou adepta de reivindicações feministas que repudiam o elogio às formas, mas foi necessário alertar, para que determinados tipos masculinos comecem a aprender que a evolução feminina reciclou tipologias clássicas, tornando imprescindível que os homens pensem bem antes de falar, pois não é qualquer asneira capaz de nos envaidecer.
Alguns de vocês gostaram dos meus textos antes mesmo de saber que foram escritos por uma mulher. Para os que acreditam ter me descoberto há dois dias, na verdade vêm me conhecendo há meses, pois em tudo que escrevo escancaro quem sou. Amanhã, já sabem, é compromisso torcer pelo futebol feminino do Brasil e antes disso, tem hoje à noite o Colorado. São novos tempos, pessoal. Atualizem-se os inadequados, as mulheres agora são bonitas, trabalham, pagam suas contas, falam sobre e até jogam futebol...
eu hein... quem me viu, quem me lê...