sexta-feira, julho 27, 2007

51 Cara de Cavalo

51

ESCRITO POR RAFAEL SEVERO

"Maurício vai pegar a bola pela direita, driblar pra lá, driblar pra cá... vai passar voando pelo lateral e vai cruzar na medida, na cabeça do "Cara de Cavalo", fazendo a massa colorada explodir de alegria no Beira-rio". Mais ou menos estas palavras foram profetizadas ao vivo pelo ponta Maurício, em entrevista para o Jornal do almoço, na manhã do dia 17 de novembro de 1992.

O Cara de Cavalo era ninguém menos que seu companheiro de ataque, o centroavante Gérson. Aliás, grande centroavante! Saudoso Gérson que, na entrevista, estava ao lado do Maurício e apenas sorria encabulado pela provocação do amigo diante das câmeras de TV.

Empolgados, eu e meus grandes amigos de segundo grau e de coloradismo nos reunimos após a aula e concentramos na expectativa do jogo. Éramos basicamente 04: Eu, Thiago, Marcelo e Daniel, com algumas variações oportunísticas de jogo para jogo, claro. Na época, havia a famosa promoção Raspa Gigante, do Asmuz, e quem tirava a raspadinha premiada tinha direito a entrar num jogo do Colorado, "de grátis"... Pois bem, nós tínhamos. Nós e mais 70 mil: nunca tinha visto o Gigante tão abarrotado. Demoramos uma eternidade pra entrar, esmagados por outros colorados e empurrados pela famosa cavalaria da Brigada. Chegamos, entramos, descolamos uma parte livre no concreto da arquibancada e esperamos pacientemente o início da partida.

E não é que, aos 9 minutos do segundo tempo, o Maurício driblou pra lá, driblou pra cá, passou voando pelo lateral adversário e cruzou na medida, na cabeça do Cara de Cavalo. A bola entrou na medida, no canto direito do goleiro adversário, na medida da profecia do Maurício, na medida do nossos sonhos... Explodimos de alegria junto com o Cara de Cavalo, com o Maurício e toda a galera do Beira-rio, como cantara o gremista Kleiton a letra do colorado Kledir. Deu pra ti, sofrimento!!! Eu chorei de emoção, abraçado aos meus amigos e despencando nos degraus da arquibancada. O Daniel perdeu os óculos em meio à balbúrdia e tateava o chão enquanto era castigado por pulos de alegria. O Marcelo e o Thiago faziam juras de amor a colorados que nunca tinham visto na vida.

Como é bom comemorar gol do nosso time. E como era bom comemorar gols do Cara de Cavalo, Richard Pryor brasileiro, o Gérson Cachaça, autor daquele gol que, por sinal, foi contra o Recreativo, na semifinal da Copa do Brasil daquele ano. O Recreativo empatou aos 30 minutos do segundo tempo, mas levamos pros tiros livres e o nosso goleirão paraguaio, o Fernandez, liquidou com os cobradores do time de pijama.

Na época, corriam boatos de que o centroavante Gérson era portador do HIV e ele, inclusive, foi às lágrimas em um programa de TV, dizendo que tinha a saúde perfeita e que aquele negócio de que estava com AIDS era invenção maldosa de alguém.

A verdade é que o grande Gérson Cara de Cavalo foi o goleador daquela Copa do Brasil. Depois, saiu do Colorado, jogou em outros clubes do futebol brasileiro até que, de fato, comprovou-se que ele realmente era soropositiovo. Faleceu no final da década de 90, se não me engano. Por questão de justiça, quero aqui render minhas homenagens a este jogador que, pra mim, foi o último grande centroavante do Beira-rio, daqueles que deram alegrias consistentes aos colorados, numa década em que felicidade era artigo raro para nós, vermelhos. Cara de Cavalo, obrigado por tudo. Fica com Deus...