sexta-feira, maio 30, 2008
88 O dia em que o Colorado vergou a gostosa
De antemão já aviso que o texto que segue não só é longo como é gigante. Talvez o maior da história do blog (favor não confundir maior com melhor). Por isso o dividi em duas partes. assim o pessoal pode dar uma pausa, tomar um café, prosseguir na labuta ou até mesmo desistir se for o caso. Mas acho que aqueles que persistirem e chegarem ao final não irão se arrepender. Assim espero... Boa leitura e um ótimo final de semana a todos.
(Parte 1)
Porto Alegre, janeiro de 2006. Rômulo andava cabisbaixo... Diria até que Rômulo andava “chicobuarquicamente” falando de lado e olhando pro chão. Também pudera, colorado descrente e cansado de comemorar apenas eventuais gauchões, Rômulo acabara de engolir uma manobra criminosa das “forças do mal”, que lhe tiraram o tão aguardado título brasileiro de 2005, levando de arrasto sua crença em dias melhores.
Rômulo não acreditava em mais nada. Não acreditava nas instituições, não acreditava no Internacional, não acreditava nem em si mesmo, tamanha amargura e decepção com a vida. Nada prestava e o tempo era mero agente burocrático que ele penosa e forçosamente se via obrigado a percorrer, pois era covarde o bastante para abreviar sua enfadonha estada nesta encarnação, segundo ele mesmo.
Por incrível que pareça, Rômulo era um sujeito carismático, culto, extrovertido, bem “apessoado” e de porte atlético, com um bom emprego, carro do ano, cobertura com churrasqueira e vista para o Guaíba, e a doce liberdade de ir e vir de sua solteiriçe. Isso fazia de Rômulo também um sucesso entre as mulheres. Então, num primeiro momento, seu azedume com a vida não tinha razão de ser. Apenas as desventuras do seu time não explicariam tamanho desencanto.
Então, possivelmente seu desânimo encontrasse resposta no nome de Jezebel. Por uma singela razão: Jezebel disse a Rômulo que nunca iria lhe dar. Na verdade, Jezebel daria pra qualquer cara que quisesse, a hora que quisesse. Daria para Porto Alegre inteira se assim desejasse; Jezebel era uma mulher exuberante: linda, charmosa, inteligente e, o mais importante, era gostosíssima. Aliás, explodia de tão gostosa. Até a unha encravada do dedo minguinho do seu pé era gostosa. Uma gata de cabelos castanhos claros, ondulados, olhos verdosos e boca carnuda, sem ser exageradamente carnuda, diga-se.
Sua gostosura realmente saltava aos olhos: suas formas eram impressionantemente desejosas, deliciosas, graciosas e mais uma infinidade de “osas”. Tão impecável que seus conhecidos diziam que ela era deformada de tão gostosa. E Rômulo era um desses conhecidos. Tinham uma roda de amigos em comum e constantemente saíam juntos. Se encontravam toda hora e naturalíssimo que Rômulo tentasse umas “bicadas” na moça.
Há tempos Rômulo vinha forcejando uma situação mais íntima entre os dois, mas a gostosa tinha dois defeitos graves: 1) era gremista; 2) era gremista ortodoxa. E isso o impedia de comê-la? Sim! Não pelo Rômulo, claro, pois ele já havia comido todas suas amigas gremistas e coloradas, sem distinção, algumas até amigas de Jezebel. A negativa vinha da moça mesmo. Ela era tão gremista, tão doente, que simplesmente se recusava a transar com um colorado. Era um dos seus dogmas de vida. E tal negativa feriu violentamente os brios do rapaz, demasiadamente vaidoso para ser descartado de cara e por motivo tão inverossímil.
O fato é que Rômulo estava obcecado por Jezebel e seu corpo monumental. E isso lhe atormentava, pois não sabia lidar com a rejeição e nem era de correr atrás de ninguém. Rômulo era incapaz de mendigar uma trepada. Humilhante isso, mas fazer o quê? Jezebel era gostosa demais e uma (im) provável conquista da moça valeria qualquer arranhão no orgulho. Na verdade, Jezebel desferiu os “golpes” com as seguintes palavras:
- Só vou te dar no dia que teu time for Campeão do Mundo, como o meu Grêmio. Afinal, nada pode ser maior que o meu Grêmio.
“Puta que pariu! Então eu nunca vou comer essa mina, tchê!” Pensou de imediato o Rômulo, desconsiderando por completo a capacidade do time do coração. Aquilo era mais que uma negativa. Para Rômulo, aquilo anulava qualquer chance de possuir aquele “corpinho”.
- Tu não te contentarias com uma Libertadorezinha?
- Ué, tu não te garante? Não leva fé no teu “timinho”? A condição é essa, meu amor! Ahahahahah
- “Tu é foda, mesmo! Mas tu vai ver. Meu time vai meter esse ano e eu vou te meter!” Resmungou Rômulo, sem muita convicção.
Por dentro, ele era só desilusão: “Putz, dependo do Inter. Tô fudido!”
E já que não tinha nada a perder, entrou na brincadeira da moça, só de brabo!
- Tá, tudo bem. Então, se meu time for Campeão do Mundo tu vais me dar, mas vais ter que vestir o manto colorado durante a relação. Aceitas?
- Fechado!
Jezebel descartava totalmente a hipótese, tanto que topou na hora a insanidade de, ela, gremista das mais xaropes, vestir o manto rubro em caso de revés. Para ela, não havia a menor possibilidade do Colorado conseguir a laureação máxima de um clube de futebol. Um absurdo! Afinal, nada poderia ser maior que o seu Grêmio...
Começa a Libertadores 2006 e o Colorado acumula boas atuações. Nada que abalasse a confiança de Jezebel no fracasso do rival. Já para Rômulo aquilo era uma boa surpresa, mas sabia que não daria em nada, infelizmente. Nas fases eliminatórias seu time iria decepcionar, com certeza. Passou a fase de grupos e o time do Fernando Carvalho estava nas oitavas.
Veio o Nacional do Uruguai e... pimba! Colorado classificado para as quartas, onde pegaria a LDU, base da seleção equatoriana que disputava a Copa da Alemanha.
“Não vai passar!” Pensava Jezebel, esbanjando otimismo.
“Putz, não tem como passar!” Conjeturava Rômulo, esbanjando pessimismo.
Terminada a Copa do Mundo, as atenções voltaram-se à Libertadores. E o Colorado despachava meia seleção do Equador com autoridade incontestável. O Libertad, de Guiñazú, era o próximo desafio.
“Bah, time desconhecido do Paraguai. Acho que esses “putos” vão para a final.” Conformava-se Jezebel.
“Bah, esse time paraguaio tem ótima campanha, tem uma fortaleza defensiva e tem um carequinha que joga muita bola. Vai ser foda, muito foda...” pensava um temeroso Rômulo.
O Libertad até ofereceu alguma resistência, mas nem Guiñazú mostrou-se capaz de parar Tinga, Fernandão, Sóbis e cia: Inter na final! Isso mesmo, Inter na final! Rômulo não podia crer. Não podia ser verdade. Como pode? Como pode? Está acontecendo mesmo? E Jezebel já começava a desmoronar por dentro. Menos mal que o adversário seria o grande São Paulo, tri campeão da Libertadores, imbatível no Morumbi, temido por todos e respeitado até pelo Boca Juniors. Não era pouca coisa. E não seria o “timinho da beira do lago” que quebraria a lógica que se desenhava no horizonte do continente. “Só o meu Grêmio, imortal tricolor, copeiro e peleador, poderia jogar de igual pra igual com o tricolor paulista, afinal, nada pode ser maior.” Delirava a gostosa.
“Bah, chegar à final já é um grande feito. O negócio é encarar o vice campeonato com dignidade, com honradez. Se perder de pouco, é lucro.” Pensava Rômulo, por óbvio.
Primeiro jogo e Sóbis “rasga e pisa em cima da camisa do São Paulo” em pleno Morumbi. Resultado de 2x1 pro Colorado e o jogo de volta para um Beira-rio de 60 mil almas afortunadas.
“Puta que pariu! A “macacada” ganhou lá. Aqui vai ser foda! Será que vou ter mesmo que dar pra esse colorado maldito?” Pensava uma angustiada Jezebel.
“Maravilha! Ganhamos! Que sorte! Que sorte! Pena que foi só de 2x1. Será pouco pra segurar o São Paulo aqui.” Resignava-se Rômulo.
O resultado de 2x2 no Gigante foi suficiente pro Colorado vergar os paulistas e cravar definitivamente seu nome na plaquinha de bronze do enorme troféu da Libertadores.
“ARRRGGGGGHHHH!!!! Eu não acredito que isso esteja acontecendo. Esse é o pior dia da minha vida! Meu consolo é que campeões do mundo eles não serão. Isso é coisa pro meu Grêmio. Afinal, nada pode ser maior.”
“AHHHHHHHHHHHH!!!! Eu não acredito que isso esteja acontecendo. Esse é o melhor dia da minha vida! Tá certo que não seremos campeões do mundo, mas assim já tá bom demais!” Vacinava-se o Rômulo.
Sem perceber, Rômulo voltava a sorrir e sua vida aos poucos saía do preto e branco. O que não faz um grande título do clube do coração? Tá certo que ele ainda queria comer a gostosa da Jezebel, mas até mesmo a impossibilidade disso ocorrer não o atormentava tanto. Já estava resignado com a iminente derrocada colorada no Japão, o que automaticamente lhe vedaria qualquer acesso à gostosa. “Simplesmente não há como vencer o Barcelona, do Dentuço!” Deduziu Rômulo.
Jezebel, não. Ela já não tinha tanta certeza assim de que o Colorado fosse fazer fiasco no mundial. Uma certa insegurança já começava a cutucar-lhe os nervos, ainda que mantivesse uma postura de confiança plena nos rivais do Colorado, pelo menos para quem a visse de fora. Naquele momento, nada podia ser maior que sua dúvida...
(Parte 2)
Tóquio, dezembro de 2006. Os egípcios do Al Ahly bem que tentaram. Marcaram Fernandão, Iarley e outros “figurões” do time, mas esqueceram da molecada do celeiro: Alexandre Pato e Luis Adriano encaminharam o Colorado para Yokohama.
Jezebel: “Ai, ai, ai... esses guris de merda quase me fizeram chorar de tristeza... e o pior é que corro mesmo o risco de dar para um colorado. O Barça é minha última esperança.”
Rômulo: “Ah, ah, ah... esses guris de ouro me fizeram chorar de alegria. Pena que não corro o risco de comer a Jezebel, gremista gostosa. Contra o Barça, não há esperança.”.
A atuação do Barça contra o América do México de certa maneira reconfortou o coração de Jezebel e reforçou a falta de crença que Rômulo nutria pelo próprio time do coração. Placar de 4x0 pró-Barça e uma aula irretocável de futebol artístico, plástico, memorável...
O Barcelona realmente era muito bonito, ocupava todos os espaços ofensivos e mantinha a posse de bola, mas na final deparou-se com a força e o pragmatismo do Colorado gaúcho. De um lado, a plasticidade – quase aristocrática – catalã. Do outro, o aguerrimento setentrional, organizado e sangüíneo de brasileiros de todas as partes, que naquele momento impregnavam-se da essência gaudéria. Gol de um alagoano! Delírio de todos gaúchos e não gaúchos, desde que colorados. Delírio de Rômulo, que chorava feito criança junto aos seus amigos de coloradismo.
- “Eu não acredito! Eu não acredito! É campeão! É campeão, porra!” Cuspia-se Rômulo, encharcado de lágrimas e suor.
Jezebel não tinha palavras. Apenas pensava: “Puta que pariu! Os “putos” ganharam mesmo! Inacreditável... Vou ter mesmo que dar para o colorado. Meu gremismo não pode ser maior que minha palavra. Trato é trato! Bom, pelo menos o Rômulo é gostosinho...”
- “É muita alegria! É muita sorte, muita sorte... Vou aproveitar esse momento, pois ele nunca se repetirá.” Prosseguia Rômulo, a essa altura esquecendo-se por completo da dívida da gostosa consigo. Naquele momento, tudo havia de ser menor.
Rômulo continuava a festa quando toca seu celular.
Rômulo atende: “Saudações do campeão do mundo FIFA!”
Era a gostosa: “Tá bom, tá bom... eu já sei! Quanta euforia, meus Deus! Antes de mais nada quero te dar os devidos parabéns e dizer que a hora que quiseres eu pago aquela minha dívida contigo, ok?
Rômulo: “O quê? Não acredito! Tens certeza? Achei que era apenas da boca pra fora e que na hora do “vamos ver” pularias fora. Tá de pegadinha, né?”
Gostosa: “Rômulo, palavra é palavra. E eu sou uma gremista de palavra, por mais que me doa. Mas se tu abres mão do pagamento...”
Rômulo: “Não, quê isso! Tô saindo agora e tô indo pra tua casa. Me espera aí, não sai daí!!!”
Gostosa: “Ah, Rômulo, eu só quero fazer uma reivindicação, posso?”
Rômulo: “Todas!”
Gostosa: “já que vou ter que usar a, argh, camisa do teu time, que seja de algum jogador que já tenha passado pelo meu Grêmio, afinal nada pode ser maior...”
Rômulo: “He, he... Deixa comigo!”
Rômulo chegou à casa da moça em questão de 20 minutos. A moça o esperava apenas de roupão. Pediu a Rômulo que lhe entregasse a camiseta do Colorado e aguardasse alguns minutos na sala. Depois, deu um grito de dentro do seu quarto, chamando o rapaz, que esfregava as mãos.
- Rômulo, vem!
E Rômulo foi, abriu lentamente a porta do quarto e lá estava ela, a desejada Jezebel, deitada de bruços em sua cama, calcinha vermelha de tirinha, minúscula, e o manto rubro com o nome do “nêgo” Tinga estampado às costas. Rômulo ainda custava a acreditar naquela visão. Será que o destino ainda lhe pregaria uma peça num último instante? Ali mesmo tirou toda a roupa, jogou os sapatos longe e parou na frente da moça, que parece ter gostado do que viu.
- Nooossa!!! Vem coloradão, não perde tempo. Vem me surrar com a tua vara!
Como que instruído por Abel Braga, Rômulo foi pra dentro dela. E iniciou os trabalhos. Virou a gostosa do avesso, com direito a todas as minúcias mais devassas do entre paredes. Jezebel parecia querer mais. E Rômulo, para agradar a moça, não decepcionou: pegou-a de quatro e sapecou uma bofetadas naquele traseirão suculento, deixando-o rubro como o manto sagrado que Jezebel trajava. Rômulo foi como uma avalanche pra cima da Jezebel, bem do jeito que a gremista gostava. E mandou ver! Ela gostava e pedia mais e mais. Aquele inusitado grenal era muito melhor do que ela podia imaginar.
E só para ela, Rômulo foi imortal, no sentido de incansável, foi forte, aguerrido e bravo. Ele não só foi maior, como foi Gigante. Atuou como Fabiano Cachaça no grenal dos 5x2. Como Larry, nos 6x2 da inauguração do Olímpico. Fez um placar dilatado para saciar o desejo de uma Jezebel possuída de êxtase profundo. Só não sussurrou cânticos em espanhol ao pé do ouvido da moça porque isso era coisa de bicha.
Rômulo, o cético, pôde, enfim, relaxar e explodir naquele momento todos benefícios que seu time acabara de lhe proporcionar. Não estava proibido de ser feliz. E aquilo não tinha preço. “Obrigado, meu Inter.” Pensava, a cada “gol” marcado.
E Jezebel estava leve, solta e louca, como nunca estivera antes nos braços de um homem. Havia descoberto sua catarse. Gemia involuntariamente e berrava feito louca. Parecia flutuar ao lado do monte Fuji. Jezebel, a gostosa, pôde, enfim, livrar-se de seu atavismo tricolor e descobrir que há coisas que podem, sim, ser maiores que o seu clube do coração...
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Ser colorado é ser desconfiado em essência e contido até o último momento. Ser colorado é ser crítico voraz – e por vezes destrutivo, impiedoso – da própria crença. Para ser colorado não basta crer, tem que ver, depois ver mais um pouco para finalmente ver de novo, sentir e depois de todo brilho e toda festa, achar que tudo não passou de um sonho louco e distante (eu sempre acho que não se deve repetir muito o gol do Gabiru, pois parece que o goleiro vai defender ou o árbitro vai anulá-lo a qualquer momento).
Ser colorado é, antes de tudo, um exercício de equilíbrio entre razão e paixão, onde invariavelmente a razão vence. O colorado é, sobretudo, um cético apaixonado. E assim se fez por auto-defesa, pois ele, o colorado, é um sobrevivente do “holocausto futebolístico” promovido sem dó nem piedade por um certo império turco-otomano e seus aliados, por pouco mais de duas longas e tortuosas décadas.
O Internacional é assim. Por vezes nos faz sofrer demasiadamente e imerecidamente; nos faz acreditar no mito intangível da felicidade. Mas ao fim e ao cabo garanto que ser colorado vale muito a pena. E às vezes a gente até se dá bem, absurdamente bem...