segunda-feira, junho 29, 2009

61 O poder das cores

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Na Copa de setenta, quando se pôde registrar o auge da ditadura militar no Brasil, sentimentos de amor e ódio à seleção misturavam-se. De um lado, pátria mãe no clima “ame-a ou deixe-a”, do outro, um exército de estudantes, intelectuais e demais cidadãos lutando por liberdade da mãe gentil. A seleção brasileira no mundial do México representava a cegueira política da classe média e, paradoxalmente, o único e legítimo verde-amarelo de todos os brasileiros.


Há um tempo vi uma entrevista com um preso político da época. Por minha eterna insuficiência em guardar nomes, não lembro o deste “João do Brasil”. Mas o fato é que João estava preso, apanhando e sendo torturado dia sim, outro também. E eis que se inicia o Copa do Mundo. Obviamente, João e seus companheiros de cela secavam a canarinha. Uma decepção nacional era a esperança de alguma reflexão do que vivia o país naquele momento.


Os dias de jogos da seleção foram revelando-se momentos de paz entre os homens do cárcere. Policiais e agentes do Dops não só aliviavam a barra dos “subversivos”, como também se permitiam unir no grito de gol. E o Brasil foi pra final. O plano, secreta e silenciosamente, ainda era torcer pra uma derrota de Pelé e Cia.


O depoimento que vi falava justamente sobre a final. O jogo foi passando e, com o relógio, a idéia de transferir à derrota o fio de esperança do país livre. Pois preso, torturado, massacrado estava o grito na garganta, forçosamente silenciado naqueles duros tempos de privações. O que iniciou como tática de guerrilha se converteu, durante noventa minutos de futebol, na oportunidade única de gritar algo verdadeiro, livre e sem repressão. Seu “João Brasileiro” contou que então no fim da partida todos se abraçaram, choraram e comemoraram o tri-mundial.


Passei por sentimento parecido, ontem, na final da Copa das Confederações. Dos tempos de governos militares até aqui, o país caminhou para democracia, ao passo que a seleção, para a ditadura dos patrocínios, dólares e euros. Perdi o interesse depois de 94 e ontem estava decidida a não torcer pro Brasil. Tal como os manifestantes presos, me rendi durante o jogo e no gol do Lúcio senti uma alegria imensa, seguida pela contagiante emoção do zagueiro que permanece grande em todos os corações colorados.


Descobri o que nos tirou o chão, que detonou nossas convicções revolucionárias, tanto em setenta quanto em dois mil e nove: a cor da camisa. No gol anulado de Kaká eu já não podia mais negar que naquele campo eu torcia pra uma camisa, amarela com detalhes verdes. Não importa se tem aquele anzol, figurando quase como “suástica da compra e venda”, continuam sendo minha gente, minhas cores, meu lugar.


E nessa terra de tantas terras, pra uma nação particular, amarela é a brasília e vermelha, a camisa. Nem sob tortura um colorado trai seu manto. Não importa a desvantagem, momento, árbitro ou fenômeno, a camisa vermelha vai entrar em campo, sendo a própria causa nobre, o ideal coletivo. E é com ela que eu vou.


A Copa é nossa.